A dicionarística mais atual portuguesa regista a forma marca de água, a saberDicionário da Língua Portuguesa do serviço Infopédia da Porto Editora, Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, enquanto os dicionários brasileiros registam marca-d’água, a saber Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa e o Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. Encontram-se, assim, atestadas duas grafias para a mesma palavra.

Segundo os textos legais que regulam a ortografia portuguesa e que dizem respeito ao uso do apóstrofo, nomeadamente a Base XVIII, alínea d), do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990) e as Bases XXXII a XXXVIII do Acordo Ortográfico de 1945, o apóstrofo é usado, e cito o Acordo de 1990:

«Emprega-se o apóstrofo para assinalar, no interior de certos compostos, a elisão do e da preposição de, em combinação com os substantivos: borda-d’água, cobra-d’água, copo-d'água, estrela-d'alva, galinha-d'água, mãe-d’água, pau-d’água, pau-d’alho, pau-d’arco, pau-d’óleo.».

Relativamente às regras ortográficas anteriores, não há alterações de maior, a não ser a omissão, talvez por lapso (?), de algumas partes e aqui sublinhadas, e cito as Bases Analíticas de 1945:

«Sempre que, no interior de uma palavra composta, se dá invariavelmente, tanto em Portugal como no Brasil, a elisão do e da preposição de, emprega-se o apóstrofo: cobra-d’água, copo-d’água (planta, etc.), galinha-d’água, mãe-d’água, pau-d’água, pau-d’alho, pau-d'arco. Dando-se, porém, o caso de essa elisão ser estranha à pronúncia brasileira e só se verificar na portuguesa, o apóstrofo é dispensado, escrevendo-se a preposição em forma íntegra: alfinete-de-ama, maçã-de-adão, mão-de-obra, pé-de-alferes

Ora, sempre que a supressão da preposição de se verifica nas duas variedades da língua, não há dúvidas quanto ao emprego do apóstrofo. Nos casos em que a elisão apenas se verifica entre falantes portugueses, e não na pronúncia brasileira, o apóstrofo é dispensado. E nos casos em que a elisão se verifica na pronúncia brasileira e a oscilação de pronúncia, entre supressão ou não do e, é manifestamente um fenómeno corrente em Portugal? Pois é neste patamar que se encontra o vocábulo em estudo.

Observe-se que o apóstrofo assinala a economia de sons em nomes compostos, fenómeno que ocorre frequentemente quando se profere o composto em questão. Não obstante, na formação do composto marca + de + água, entre o significado de cada um dos seus elementos, o composto, por si mesmo, apresenta uma especificidade própria, ou seja, o significado de cada um dos seus elementos isolados é diferente da soma de todos os seus elementos, ou seja: uma marca de água (sentido literal) é diferente de uma marca-d’água (desenho ou inscrição).

Concluindo: embora as duas grafias sejam admissíveis, recomenda-se a adoção da grafia marca-d’água de forma a garantir a individualidade do termo em questão.

Um outro ponto que pode ainda ser debatido relativamente ao composto marca-d’água é o seu significado. Em muitos dicionários, o vocábulo figura como sinónimo de filigrana.

No âmbito da língua portuguesa do trabalho desenvolvido por especialistas, parece haver vantagens em estabelecer uma distinção entre os vocábulos filigrana e marca-d’água. Vejamos:

filigrana, do italiano filigrana, ‘trabalho de ourivesaria com entalhes formados de fios delicados’, pelo latim filu(m) ‘fio’, deveria ser reservado apenas para fazer referência aos fios metálicos, geralmente de cobre, que formam uma marca distintiva (desenho ou inscrição) numa pasta de papel;

marca-d’água é a marca distintiva (desenho ou inscrição) impressa numa folha de papel durante a sua fabricação, geralmente pouco percetível e mais visível à contraluz [o nome parece advir do facto de a marca-d’água, sendo menos opaca que o resto do papel, parecer ter sido produzida pela ação da água; as marcas-d’água apresentam desenhos muito variados: emblemas heráldicos, escudos, figuras mitológicas, instrumentos musicais, monogramas, objetos diversos, podendo ainda representar a marca do fornecedor do papel].

Lisboa, 12 de novembro de 2015
Ana Salgado 

Vocabulário da Língua Portuguesa é um dos recursos lexicográficos de referência da Academia das Ciências de Lisboa. Embora se tenha tomado como base de partida os anteriores vocabulários académicos, este vocabulário digital foi elaborado inteiramente de novo.

Apoio

Parceiros

Boletim Informativo

Por favor habilite seu javascript para enviar este formulário