A conhecida supressão de consoantes «mudas», quando não pronunciadas, ditada pelas novas regras ortográficas, gera, em determinados casos, homonímias que deverão ser evitadas em qualquer sistema ortográfico que se pretenda simplificado e objetivo. É o caso em que se encontram os pares óptica/óptico (vocábulos relacionados com a visão) vs. ótica/ótico (vocábulos relacionados com a audição). Vejamos o que a supressão da consoante etimológica pode provocar: Lesões no nervo ótico.

Estaremos perante lesões no nervo visual ou auditivo? Análise de um ponto de vista ótico. Uma análise segundo princípios da visão ou da audição? Consultando o Vocabulário Ortográfico Comum da Língua Portuguesa (VOC), óptica/óptico são consideradas grafias brasileiras; quanto a ótica/ótico, ambas as grafias são atestadas sem qualquer tipo de indicação. O Vocabulário de Mudança, disponível no Portal da Língua Portuguesa, e cuja equipa é a mesma do VOC, declara expressamente: «óptica não é usado em Portugal» e «óptico não é usado em Portugal». Dicionários conhecidos em Portugal, como o da Porto Editora (serviço Infopédia) e o da Priberam, dão conta da queda das consoantes etimológicas, apoiados no critério fonético. No entanto, a consoante ‘p’ nos casos em discussão nem sempre é propriamente muda na pronúncia individual dos vários falantes de língua portuguesa. Com outro entendimento, é de referir o Vocabulário Ortográfico Atualizado da Língua Portuguesa, publicado pela Academia das Ciências de Lisboa, em 2012, que regista as duas grafias, óptica e ótica (págs. 738, 744).
No Brasil, esta questão não se põe. Se consultarmos o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (versão em linha), editado pela Academia Brasileira de Letras, a distinção mantém-se:

óptica s.f. “ciência da visão”; cf. ótica

ótica s.f. “ciência da audição”; cf. óptica

Pelo risco de homonímia insanável, a Comissão de Lexicologia e Lexicografia da Língua Portuguesa sugere a manutenção da consoante etimológica, permitindo a distinção das formas gráficas: ótica (do radical grego ous, ôtós — cf. designação da especialidade clínica otorrinolaringologia) óptica (do grego optós — cf. especialidade de oftalmologia) não obstante o uso predominante desta palavra com apagamento da articulação da consoante labial.

Tendo em conta o exposto, propõe-se, em primeiro lugar, a reposição da consoante etimológica nos referidos vocábulos e em palavras da mesma família e, em segundo lugar, uma nova redação do texto legal que recomende explicitamente esta manutenção, podendo ser considerada uma exceção à supressão geral das consoantes ditas «mudas». Afinal, o próprio texto do Acordo Ortográfico de 1990, em capítulo diferente, o da eliminação do acento diferencial em paroxítonos que possuem uma homógrafa sem acentuação própria, mantém a distinção entre pôr (verbo) e por (preposição), um par semelhante ao anterior, e também entre pôde (pretérito perfeito) e pode (presente). Oportunamente, também a Comissão se pronunciará sobre o aumento de situações de homografia geradas com esta nova regra, e que interferem com a velocidade do processamento da informação no ato de leitura.

 

Lisboa, 17 de novembro de 2015

Comissão do Instituto de Lexicologia e Lexicografia da Língua Portuguesa

Vocabulário da Língua Portuguesa é um dos recursos lexicográficos de referência da Academia das Ciências de Lisboa. Embora se tenha tomado como base de partida os anteriores vocabulários académicos, este vocabulário digital foi elaborado inteiramente de novo.

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